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O encanto do Natal

No Natal, os corações ficam mais vulneráveis e as pessoas, mais generosas. Mas se para muitos a ocasião é festiva e a mesa é farta, para outros pode ser um momento de grande solidão e escassez. Em meio às casas enfeitadas, cheias de brilho e de luz, às reuniões de família e ao alvoroço das crianças que aguardam ansiosamente a chegada do Papai Noel carregado de pacotes, há aqueles que não veem motivo para comemorar, seja por não ter com quem contar, seja por falta de recursos, ou simplesmente por não enxergar o verdadeiro sentido dessa confraternização. Talvez por isso essa seja uma época que inspira contos literários tão significativos, capazes de enternecer até os mais impassíveis.

“O Natal desperta, na maioria das pessoas, fortes sentimentos. Traz reminiscências familiares saudosas ou alegres, estimula a busca de serenidade e comunhão e nos leva a pensar sobre nós mesmos, nossas atitudes, desejos, esperanças”, ressalta a escritora Marcia Kupstas. “Tudo isso constitui matéria-prima ideal para a arte literária. O encanto das histórias natalinas é o ‘espelho’ que elas propiciam. Os leitores se reconhecem nos personagens mesquinhos, solidários, solitários, altruístas, tristes… Seja um bom ou mau retrato, o leitor sente profunda empatia por narrativas que registram as experiências vividas nesse período do ano.”

Com cerca de 100 livros publicados, entre eles os premiados É preciso lutar e Eles não são anjos como eu, Marcia Kupstas fez uma adaptação para teatro de Christmas Carol (1843), de Charles Dickens, “o clássico dos clássicos natalinos” que ganhou várias edições ao longo dos anos, denominadas Canção de Natal ou Uma história de Natal. O reconto de Márcia Kupstas, A última chance, é uma versão para o público juvenil da famosa história de redenção do sr. Scrooge, indivíduo intolerante e sovina, incapaz de sentir complacência pelo sofrimento alheio ou compaixão pelos pobres. Nenhuma centelha de generosidade, amor e alegria aquecia seu coração enrijecido até receber, na véspera do Natal, a visita inesperada de três espíritos: o dos Natais passados, o do Natal presente e o dos Natais futuros. Cada um dos fantasmas o conduz numa jornada assombrosa, levando-o a rever sua trajetória de indiferença perante a dor e as dificuldades de seus semelhantes, a perceber como isso lhe trouxera isolamento e solidão e a vislumbrar um futuro ainda mais sombrio. Como recuperar esses bens mais preciosos que o dinheiro? “Acho que a maioria de nós se alegra em ver que até alguém tão terrível como ele tem sua segunda chance, que a salvação é possível”, diz Marcia.

Uma fábula bem mais recente é Mistério de Natal, de Jostein Gaarder (autor de O mundo de Sofia), que tem encantado os jovens não só pelo conteúdo interessante como pela linguagem direta e fluente. Os acontecimentos se desenrolam a partir do calendário de Natal que o menino Joaquim ganha de seu pai, uma tradição na Noruega. São 24 portinhas que escondem surpresas e devem ser abertas uma de cada vez durante o mês de dezembro. No calendário mágico de Joaquim, os personagens são levados de volta ao passado, numa peregrinação pelos lugares importantes da história do cristianismo, até chegar à cidade de Belém e descobrir que essa será sempre a mais bonita de todas as comemorações.

A tradição natalina é vista por vários prismas na coletânea Contos de Natal, organizada por Vilma Maria da Silva, que reúne autores como Fernando Pessoa, Eça de Queirós, Humberto de Campos, Machado de Assis, Lima Barreto, Lygia Fagundes Telles e outros. O presente dos magos, texto de O. Henry e ilustrações de Odilon Moraes, é um conto antigo, de 1906, que se tornou popular pela singeleza do conteúdo: um jovem casal apaixonado, que vive em extrema pobreza, consegue se presentear no Natal com uma surpreendente e linda prova de amor. Vale ressaltar ainda a curiosa história criada por Ana Maria Machado em O Natal de Manuel. A escritora mostra, de forma divertida, como é confuso para uma criança entender o que é o Natal, pois cada um tem o seu jeito de ver e explicar a data. Para alguns, é a comemoração do aniversário de Jesus; para outros, uma boa ocasião para ganhar dinheiro. Há também quem o veja como um dia de ficar em casa de folga ou então como uma trabalheira na cozinha, como um dia de usar vestido novo ou de ganhar presente se for bonzinho…

E há uma série de outras opções atraentes para os pequenos, como o texto gostoso de Ruth Rocha em Alvinho e os presentes de Natal, enriquecido com as charmosas e singulares ilustrações de Suppa; o visual e supercolorido Olivia ajuda no Natal, de Ian Falconer; Rodolfo e o encanto do Natal, de Rob Scotton, em que o simpático carneirinho ajuda o Papai Noel a salvar o Natal; e a caprichada edição de O quebra-nozes que, produzida por Kathryn Smith e Richard Jewitt, com tradução e adaptação de Marlise Buchweitz Klug, apresenta a clássica fábula por meio de imagens tridimensionais. Não há criança que resista!

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Arquivado em Revista Platero